Questão 89, caderno azul do ENEM 2020

Adão, ainda que supuséssemos que suas faculdades racionais fossem inteiramente perfeitas desde o início, não poderia ter inferido da fluidez e transparência da água que ela o sufocaria, nem da luminosidade e calor do fogo que este poderia consumi-lo. Nenhum objeto jamais revela, pelas qualidades que aparecem aos sentidos, nem as causas que o produziram, nem os efeitos que dele provirão; e tampouco nossa razão é capaz de extrair, sem auxílio da experiência, qualquer conclusão referente à existência efetiva de coisas ou questões de fato.

HUME, D. Uma investigação sobre o entendimento humano. São Paulo: Unesp, 2003

Segundo o autor, qual é a origem do conhecimento humano?

A)  A potência inata da mente.

B)  A revelação da inspiração divina.

C)  O estudo das tradições filosóficas.

D)  A vivência dos fenômenos do mundo.

E)  O desenvolvimento do raciocínio abstrato.

Resolução em texto

Matérias Necessárias para a Solução

  • Filosofia Moderna
  • Empirismo
  • Teoria do Conhecimento

Nível da Questão: Médio – Exige interpretação de texto e conhecimentos sobre impacto ambiental e poluição urbana.

Gabarito: LETRA D – A vivência dos fenômenos do mundo


Passo 1: Análise do Comando e Definição do Objetivo

Comando da questão:

O comando solicita a identificação da origem do conhecimento humano segundo David Hume, com base no excerto fornecido.

Palavras-chave:

  • “Faculdades racionais”: Refere-se às capacidades intelectuais do ser humano, como raciocínio e lógica. No contexto da questão, Hume critica a ideia de que o raciocínio inato é suficiente para compreender o mundo.
  • “Sem auxílio da experiência”: Indica que o autor enfatiza a experiência como essencial para a formação do conhecimento humano, rejeitando a ideia de que a razão pode funcionar isoladamente.
  • “Nenhum objeto revela pelas qualidades que aparecem aos sentidos”: Salienta que apenas observações repetidas podem revelar as relações causais entre os fenômenos.

Objetivo:

Compreender a perspectiva empirista de Hume, que estabelece a experiência sensorial como base para o conhecimento humano.


Passo 2: Tradução e Interpretação do Texto

O texto explica que a razão, por si só, tem um papel limitado na compreensão do mundo, sendo a experiência indispensável para adquirir conhecimento. Hume argumenta que nenhuma qualidade sensorial, como a transparência da água ou a luminosidade do fogo, pode revelar, sozinha, as causas ou efeitos dos fenômenos. Só aprendemos o que essas coisas podem fazer ao observarmos e vivermos situações no mundo real.

Frases-chave do texto:

  1. “Nenhum objeto jamais revela… nem as causas que o produziram, nem os efeitos que dele provirão”: Essa frase destaca a impossibilidade de compreender relações causais apenas por meio da razão ou da observação estática.
  2. “Nossa razão não é capaz de extrair, sem auxílio da experiência”: Indica que a experiência é indispensável para a construção de conhecimentos concretos sobre o mundo.
  3. “Sem auxílio da experiência, não podemos concluir nada referente à existência efetiva”: Reflete a visão empirista de Hume, segundo a qual toda compreensão das relações de causa e efeito depende de experiências acumuladas.

Interpretação Geral:
O conhecimento humano, segundo Hume, surge da observação e vivência direta dos fenômenos do mundo, sendo a experiência o ponto central para a compreensão de relações causais.


Passo 3: Explicação de Conceitos e Conteúdos Necessários

1. Empirismo:
Corrente filosófica que sustenta que todo conhecimento provém da experiência sensorial. A experiência sensorial é o conhecimento que adquirimos por meio dos nossos sentidos, como visão, audição, tato, olfato e paladar. É através dessas percepções que observamos, sentimos e interagimos com o mundo ao nosso redor, formando ideias e aprendendo sobre a realidade. Para Hume, é esse tipo de experiência que serve como base para todo o conhecimento humano. Essa abordagem contrapõe-se ao racionalismo, que valoriza o raciocínio abstrato e ideias inatas.

2. Experiência e Causalidade:
Para Hume, a compreensão de causa e efeito só pode ser adquirida pela repetição de experiências sensíveis. Por exemplo, sabemos que o fogo queima porque já tivemos contato direto ou observamos situações onde o fogo causou dor ou destruição ao tocar algo. Isso pode ter ocorrido ao sentir o calor próximo a uma chama, queimar a pele ao tocar o fogo ou ao ver objetos sendo consumidos por ele. Essas experiências sensoriais (como o calor sentido pela pele ou a observação visual de algo queimando) nos permitem associar o fogo à ideia de perigo ou dano. Sem essas vivências, não teríamos como saber, apenas olhando para o fogo, que ele pode queimar.

3. Crítica à Razão Inata:
Hume rejeita a ideia de que o conhecimento pode ser derivado exclusivamente da razão ou de faculdades inatas. Ele argumenta que a razão só funciona quando fundamentada na experiência prática.

4. Papel dos Sentidos:
Os sentidos captam informações sobre os fenômenos, mas é a experiência acumulada que permite organizar e interpretar essas informações como conhecimento.


Passo 4: Desenvolvimento do Raciocínio

O excerto demonstra a base da filosofia empirista de Hume, que coloca a experiência como origem do conhecimento humano. Para o autor, nenhuma qualidade sensorial, isolada, permite inferir as causas ou os efeitos de um fenômeno. Por exemplo:

  • A fluidez e transparência da água não revelam que ela pode afogar uma pessoa.
  • A luminosidade e o calor do fogo não indicam, sem experiência, que ele pode queimar.

Assim, Hume enfatiza que o aprendizado humano ocorre pela vivência repetida dos fenômenos e pela observação prática. Essa visão refuta tanto o racionalismo quanto a crença em ideias inatas ou inspirações divinas, posicionando o empirismo como a base da epistemologia.


Passo 5: Análise das Alternativas e Resolução

A) A potência inata da mente
Errada. A potência inata da mente e as ideias inatas são conceitos defendidos pelo racionalismo, que acredita que o ser humano já nasce com certos conhecimentos ou capacidades pré-existentes, como noções lógicas ou universais. Por exemplo, a ideia de que “o todo é maior que a parte” seria algo natural à mente, que não precisa ser aprendido. Hume rejeita essa ideia, afirmando que todo conhecimento vem da experiência sensorial, como aprender que o fogo queima ao observá-lo ou vivenciá-lo.

B) A revelação da inspiração divina
Errada. Hume, como empirista, não utiliza fundamentos religiosos para explicar o conhecimento humano. Para estar correta, a alternativa deveria ser compatível com uma perspectiva teológica, o que não é o caso do texto.

C) O estudo das tradições filosóficas
Errada. Hume não defende o aprendizado a partir de tradições ou estudos abstratos. Ele valoriza a vivência e a observação direta dos fenômenos como fonte do conhecimento.

D) A vivência dos fenômenos do mundo
Correta. Hume argumenta que o conhecimento humano se origina da observação e vivência direta dos fenômenos. A experiência sensorial e repetida permite compreender relações causais e efeitos, tornando essa alternativa compatível com o texto.

E) O desenvolvimento do raciocínio abstrato
Errada. Embora Hume reconheça o papel do raciocínio, ele enfatiza que ele só funciona quando fundamentado na experiência. Para estar correta, essa alternativa precisaria destacar a dependência do raciocínio em relação à vivência sensorial.


Passo 6: Conclusão e Justificativa Final

A visão empirista de Hume sustenta que o conhecimento humano é adquirido por meio da experiência sensorial e da observação prática dos fenômenos. Nenhuma ideia inata, inspiração divina ou estudo abstrato é suficiente para compreender as relações causais sem a vivência direta. A alternativa correta é D – A vivência dos fenômenos do mundo, pois reflete o papel central da experiência no processo de conhecimento segundo Hume.

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