Questão 80, caderno azul do ENEM PPL 2019

A população africana residente nesta província, bem como a de todo o Império, compõe-se de indivíduos de diferentes lugares da África que variam em costumes e religiões; a que aqui segue o maometismo, à qual pertencemos, é uma população pequena, porém, distinta entre si, e notando a necessidade de sustentarmos nosso culto e fundados ainda no artigo 5º da Constituição do Império, requeremos ao sr. chefe de polícia licença para exercermos o culto.

REIS, J. J.; GOMES, F. S.; CARVALHO, M. J. M. O Alufá Rufino: tráfico, escravidão e liberdade no Atlântico negro (1822-1853). 
São Paulo: Cia. das Letras, 2010 (adaptado).

O pedido de um grupo de africanos de Recife ao chefe de polícia local tinha como objetivo, naquele contexto,

A) criticar a doutrina oficial.

B) professar uma fé alternativa.

C) assegurar a cidadania política.

D) legalizar os terreiros de candomblé.

E) eliminar algumas tradições culturais.

📚 Matérias Necessárias para a Solução da Questão

  • História do Brasil Império
  • Cultura afro-brasileira e religiosidade
  • Constituição de 1824
  • Direitos civis e liberdade religiosa no século XIX
  • Islamismo entre populações escravizadas

🎯 Nível da Questão: Médio.

✅ Gabarito: Letra B.


Resolução Passo a Passo

📖 Passo 1: Análise do Comando e Definição do Objetivo

A questão parte de um excerto histórico em que um grupo de africanos residentes no Recife pede permissão ao chefe de polícia para exercer seu culto religioso. O enunciado pergunta qual era o objetivo desse pedido, dentro daquele contexto.

O comando busca identificar a intenção histórica por trás de uma ação de um grupo africano — ou seja, requer compreender a relação entre liberdade religiosa, cultura africana e a realidade institucional e política do Império do Brasil.
Palavras-chave importantes:

  • População africana
  • Maometismo (termo histórico para islamismo)
  • Artigo 5º da Constituição do Império
  • Exercer o culto

🎯 Objetivo da questão: identificar que esse grupo estava tentando garantir o direito à prática de sua fé (islâmica), distinta da fé católica oficial, por meio de um apelo institucional à Constituição vigente.


📖 Passo 2: Explicação de Conceitos e Conteúdos Necessários

Durante o século XIX, o Brasil Império mantinha o catolicismo como religião oficial do Estado, mas a Constituição de 1824 previa (de forma limitada) a liberdade de culto privado para outras religiões. O artigo 5º dessa constituição dizia que “a religião católica apostólica romana continuará a ser a religião do Império. Todas as outras religiões serão permitidas com seu culto doméstico ou particular em casas para isso destinadas, sem forma alguma exterior do templo.”

Africanos trazidos ao Brasil como escravizados praticavam diversas religiões — entre elas, religiões tradicionais africanas, o islamismo e posteriormente formas sincréticas como o candomblé. O islamismo, especialmente na Bahia e em Recife, era praticado por grupos como os malês, que também usavam a escrita árabe e possuíam forte organização social e religiosa.

🚩 Assim, para manter suas práticas religiosas sem represálias do Estado ou da Igreja, muitos desses grupos buscavam respaldo legal, ainda que limitado.


📖 Passo 3: Tradução e Interpretação do Texto

Vamos destacar trechos fundamentais do texto:

“compõe-se de indivíduos de diferentes lugares da África que variam em costumes e religiões”
Esse trecho já indica a diversidade cultural e religiosa dos africanos trazidos para o Brasil.

“a que aqui segue o maometismo […] é uma população pequena, porém, distinta entre si”
Aqui se identifica o grupo islâmico dentro dessa diversidade — ou seja, não era o grupo majoritário, mas tinha uma identidade clara.

“notando a necessidade de sustentarmos nosso culto […] requeremos […] licença para exercermos o culto.”
Este é o trecho central: o grupo deseja oficialmente professar seu culto, com base legal no artigo 5º.

🧠 Interpretação geral: Em meio à pluralidade cultural africana e à hegemonia do catolicismo no Império, esse grupo islâmico buscava garantir espaço para manter sua prática religiosa — algo que, se não autorizado, poderia ser reprimido pelo Estado como “idolatria”, “feitiçaria” ou subversão.


📖 Passo 4: Análise das Alternativas e Resolução

A) criticar a doutrina oficial 🔴
➡ Errada. O texto não faz uma crítica ao catolicismo ou ao Estado. O tom é de respeito institucional, pedindo licença com base na Constituição.
Como poderia estar correta? Se o texto contivesse um ataque explícito à doutrina católica ou uma denúncia de perseguição religiosa.


B) professar uma fé alternativa 🟢
➡ Correta. O grupo busca autorização para manter seu culto religioso específico, distinto do catolicismo dominante, exercendo o direito de liberdade de culto previsto em lei.
✔ Isso está bem fundamentado no trecho “necessidade de sustentarmos nosso culto” e na menção ao artigo 5º.


C) assegurar a cidadania política 🔴
➡ Errada. Cidadania política diz respeito ao direito de votar, ser votado, participar das decisões públicas — algo que escravizados e libertos não tinham plenamente. O pedido trata de religião, não de participação política.
Como poderia estar correta? Se o pedido fosse sobre o direito ao voto, à participação em conselhos ou cargos públicos.


D) legalizar os terreiros de candomblé 🔴
➡ Errada. O grupo mencionado é seguidor do islamismo (“maometismo”), não das religiões afro-brasileiras como o candomblé.
Como poderia estar correta? Se o texto se referisse explicitamente a práticas afro-brasileiras como orixás, sacrifícios, etc.


E) eliminar algumas tradições culturais 🔴
➡ Errada. O grupo não quer eliminar nada — ao contrário, deseja preservar e continuar suas práticas religiosas.
Como poderia estar correta? Se o pedido mencionasse o abandono de certas práticas em nome da integração social, por exemplo.


🏆 Passo 5: Conclusão e Justificativa Final

A questão gira em torno da diversidade religiosa trazida pelos africanos escravizados ao Brasil e do esforço de um grupo islâmico em Recife para garantir a prática de sua fé. O texto revela uma tentativa legítima de exercer o direito à liberdade religiosa, respaldada na Constituição de 1824.

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