A historiografia do país demonstra que foi necessário considerável esforço do colonizador português em impor sua língua pátria em um território tão extenso. Trata-se de um fenômeno político e cultural relevante o fato de, na atualidade, a língua portuguesa ser a língua oficial e plenamente inteligível de norte a sul do país, apesar das especificidades e da grande diversidade dos chamados “sotaques” regionais. Esse empreendimento relacionado à imposição da língua portuguesa foi adotado como uma das estratégias de dominação, ocupação e demarcação das fronteiras do território nacional, sucessivamente, em praticamente todos os períodos e regimes políticos. Da Colônia ao Império, da República ao Estado Novo e daí em diante.
Tomemos como exemplo o nheengatu, uma língua baseada no tupi antigo e que foi fruto do encontro, muitas vezes belicoso e violento, entre o colonizador e as populações indígenas da costa brasileira e de grande parte da Amazônia. Foi a língua geral de comunicação no período colonial até ser banida pelo Marquês de Pombal, a partir de 1758, caindo em pleno processo de desuso e decadência a partir de então. Foram falantes de nheengatu que nominaram uma infinidade de lugares, paisagens, acidentes geográficos, rios e até cidades. Atualmente, resta um pequeno contingente de falantes dessa língua no extremo norte do país. É utilizada como língua franca em regiões como o Alto Rio Negro, sendo inclusive fator de afirmação étnica de grupos indígenas que perderam sua língua original, como os Barés, Arapaços, Baniwas e Werekenas.
Disponível em: http://desafios.ipea.gov.br. Acesso em: 20 out. 2021 (adaptado).
Da leitura do texto, depreende-se que o patrimônio linguístico brasileiro é
A) constituído por processos históricos e sociais de dominação e violência.
B) decorrente da tentativa de fusão de diferentes línguas indígenas.
C) exemplificativo da miscigenação étnica da sociedade nacional.
D) caracterizado pela diversidade de sotaques e regionalismos.
E) resultado de sucessivas ações de expansão territorial.

Resolução em texto
Matérias Necessárias para a Solução da Questão:
- Interpretação de texto
- História sociolinguística do Brasil
- Processos de colonização e imposição de línguas
Nível da Questão:
- Médio
Gabarito:
- Alternativa A
Tema/Objetivo Geral:
- Compreender como o patrimônio linguístico brasileiro se formou historicamente por meio de processos de colonização e violência, evidenciando o papel da imposição do português e a erradicação de línguas indígenas, como o nheengatu.
🔹 Passo 1: Análise do Comando e Definição do Objetivo
Comando da Questão: “Da leitura do texto, depreende-se que o patrimônio linguístico brasileiro é…”
Explicação Detalhada: O enunciado pede que se identifique qual das opções resume a principal conclusão que se pode extrair do texto sobre o processo histórico de formação do patrimônio linguístico brasileiro.
Identificação de Palavras-chave:
- “historiografia do país”
- “língua portuguesa imposta”
- “fenômeno político e cultural”
- “nheengatu”
- “estratégias de dominação, ocupação e demarcação”
Definição do Objetivo:
Verificar como, segundo o texto, a imposição do português e o banimento de línguas como o nheengatu refletem um processo histórico de dominação e violência, resultando na consolidação do patrimônio linguístico brasileiro.
Dica ao Aluno:
Quando o texto menciona imposição, banimento de línguas e estratégias de ocupação territorial, pense em processos políticos e sociais de coerção que afetaram diretamente a formação linguística do país.
🔹 Passo 2: Explicação de Conceitos Necessários
- Patrimônio Linguístico:
- Conjunto de línguas, dialetos e sotaques que compõem a identidade linguística de um país ou região.
- Envolve tanto as línguas oficiais quanto as línguas minoritárias, indígenas, etc.
- Imposição Linguística:
- Fenômeno em que a língua de um grupo dominante substitui ou marginaliza as línguas de grupos subalternos.
- Geralmente envolve coerção ou legislação que suprime a língua nativa (como no caso do Marquês de Pombal com o nheengatu).
- Nheengatu:
- Língua geral derivada do tupi antigo, amplamente falada no período colonial.
- Sofreu proibição oficial e declínio, sobrevivendo hoje em regiões específicas (Alto Rio Negro, por exemplo).
Para Você, Aluno:
Perceba como o texto relaciona violência e dominação à perda de línguas nativas. Esse contexto histórico é crucial para entender a formação do português como língua oficial.
🔹 Passo 3: Tradução e Interpretação do Texto
Coloque-se no Lugar do Leitor:
- O texto narra como a língua portuguesa foi imposta num território vasto, descrevendo isso como uma estratégia de controle.
- Fala também do banimento do nheengatu, mostrando a “violência cultural” contra línguas indígenas.
- Ressalta que tal imposição se manteve em diversos períodos políticos (Colônia, Império, República, Estado Novo etc.).
O que Isso Significa?
- A consolidação do português não foi um simples processo “natural” de adoção, mas envolveu coerção, política de Estado e desprezo pelas línguas indígenas.
- É um processo político e cultural marcado por dominação.
Conclusão Intermediária:
O texto enfatiza que o patrimônio linguístico atual (predomínio do português) decorre, em boa medida, de imposições e de ações políticas que reprimiram outras línguas.
🔹 Passo 4: Desenvolvimento do Raciocínio
- Ponto Central:
- O texto diz: “Esse empreendimento relacionado à imposição da língua portuguesa foi… uma das estratégias de dominação…”
- Ou seja, a formação do patrimônio linguístico está ligada à dominação.
- Caso do Nheengatu:
- Língua resultante do contato com o tupi antigo.
- Banida em 1758, caiu em desuso.
- Mostra a força política do colonizador.
- Consequências:
- O português se tornou oficial de norte a sul.
- “Apesar das especificidades” → houve diversidade de sotaques, mas a base é a mesma: o português.
- Isso foi “adotado como estratégia de dominação e ocupação do território.”
Ligação com as Alternativas:
Observe como a imposição se relaciona a violência cultural e política, o que se reflete na opção que menciona “processos históricos e sociais de dominação e violência.”
🔹 Passo 5: Análise das Alternativas e Resolução
A) “constituído por processos históricos e sociais de dominação e violência.”
- Combina perfeitamente com a descrição do texto, que fala do banimento do nheengatu, a imposição do português e o uso político de tal medida.
B) “decorrente da tentativa de fusão de diferentes línguas indígenas.”
- O texto não menciona “fusão” de línguas indígenas como fator principal, mas sim imposição do português e supressão do nheengatu.
C) “exemplificativo da miscigenação étnica da sociedade nacional.”
- A ideia de miscigenação não é o foco. O texto destaca coerção e banimento, não miscigenação linguística.
D) “caracterizado pela diversidade de sotaques e regionalismos.”
- Embora o texto mencione a diversidade de sotaques, não diz que esse é o ponto central de constituição do patrimônio linguístico.
E) “resultado de sucessivas ações de expansão territorial.”
- As ações políticas de expansão foram parte do processo, mas o texto frisa a dominação e violência como fator essencial, não apenas expansão territorial.
Resposta Correta: A.
🔹 Passo 6: Conclusão e Justificativa Final
Resumo do Raciocínio:
- O texto mostra que a oficialização do português e o declínio de línguas como o nheengatu resultam de estratégias políticas de imposição cultural.
- Há uma forte relação entre o predomínio do português e o exercício de poder do colonizador, com banimentos, repressões e legislações que revelam violência e dominação.
Reafirmação da Alternativa Correta:
A) constituído por processos históricos e sociais de dominação e violência.
Resumo Final:
- O texto expõe como o português se tornou hegemônico por meio de políticas de Estado que baniram línguas indígenas e impuseram a língua do colonizador, configurando um processo de dominação cultural marcado pela violência.
Mensagem ao Aluno:
Sempre busque entender como e por que uma língua se torna dominante. Na história do Brasil, a consolidação do português envolveu muito mais do que simples convivência: foi um projeto político que incluiu proibições e violência cultural contra outras línguas.