Questão 17, caderno azul do ENEM 2021 – DIA 1

A história do futebol brasileiro contém, ao longo de um século, registros de episódios racistas. Eis o paradoxo: se, de um lado, a atividade futebolística era depreciada aos olhos da “boa sociedade” como profissão destinada aos pobres, negros e marginais, de outro, achava-se investida do poder de representar e projetar a nação em escala mundial. A Copa do Mundo no Brasil, em 1950, viria a se constituir, nesse sentido, em uma rara oportunidade. Contudo, na decisão contra o Uruguai sobreveio o inesperado revés. As crônicas esportivas elegiam o goleiro Barbosa e o defensor Bigode como bodes expiatórios, “descarregando nas costas” dos jogadores os “prejuízos” da derrota. Uma chibata moral, eis a setença proferida no tribual dos brancos. Nos anos 1970, por não atender às expectativas normativas suscitadas pelo estereótipo do “bom negro”, Paulo César Lima foi classificado como “jogador-problema”. Ele esboçava a revolta da chibata no futebol brasileiro. Enquanto Barbosa e Bigode, sem alternativa, suportaram o linchamento moral na derrota de 1950, Paulo César contra-atacava os que pretendiam condená-lo pelo insucesso de 1974. O jogador assumia as cores e as causas defendidas pela esquadra dos pretos em todas as esferas da vida social. “Sinto na pele esse racismo subjacente”, revelou à imprensa francesa: “Isto é, ninguém ousa pronunciar a palavra ‘racismo”. Mas posso garantir que ele existe, mesmo na Seleção Brasileira”. Sua ousadia consistiu em pronunciar a palavra interdita no espaço simbólico do discurso oficial para reafirmar o mito da democracia racial.

Disponível em: https://observatorioracialfutebol.com.br. Acesso em: 22 jun. 2019 (adaptado).

O texto atribui o enfraquecimento do mito da democracia racial no futebol à

A) responsabilização de jogadores negros pela derrota na final da Copa de 1950.

B) projeção mundial da nação por um esporte antes destinado aos pobres.

C) depreciação de um esporte associado à marginalidade.

D) interdição da palavra “racismo” no contexto esportivo.

E) atitude contestadora de um “jogador-problema”.

Resolução em Texto

Matérias Necessárias para a Solução:

  • Interpretação de texto.
  • Análise de contextos históricos e sociais.

Nível da Questão: Médio.

Gabarito: Letra E.


1º Passo: Análise do Comando e Definição do Objetivo

Comando da Questão:
Identificar o elemento que o texto aponta como responsável pelo enfraquecimento do mito da democracia racial no futebol brasileiro.

Palavras-chave:

  • “enfraquecimento do mito”
  • “democracia racial”
  • “futebol brasileiro”

Objetivo:
Compreender como as atitudes e ações de jogadores negros contribuíram para desmascarar o mito da democracia racial no futebol, especialmente no contexto das décadas de 1950 e 1970.

Dica Geral:
⚠️ Preste atenção ao papel de Paulo César Lima, destacado no texto como uma figura contestadora do racismo estrutural e simbólico no futebol.


2º Passo: Tradução e Interpretação do Texto

O texto aborda episódios de racismo no futebol brasileiro, destacando:

  1. Copa de 1950:
    • Barbosa e Bigode, jogadores negros, foram responsabilizados pela derrota, carregando o estigma moral imposto pela sociedade branca.
  2. Década de 1970:
    • Paulo César Lima, por sua postura crítica e questionadora, foi rotulado como “jogador-problema”.
    • Ele denunciou o racismo “subjacente” no futebol brasileiro, desafiando o mito da democracia racial.

Conclusão parcial:
O enfraquecimento do mito ocorreu porque Paulo César Lima, ao contrário de Barbosa e Bigode, enfrentou e verbalizou o racismo, expondo a hipocrisia do discurso oficial sobre igualdade racial.


3º Passo: Explicação de Conceitos Necessários

  • Democracia racial:
    • Ideia de que o Brasil seria um país livre de racismo, com convivência harmônica entre diferentes etnias, algo desmentido por fatos históricos e sociais.
  • Racismo subjacente:
    • Forma de racismo disfarçada, em que práticas discriminatórias são veladas e não nomeadas explicitamente.
  • “Jogador-problema”:
    • Rotulação de atletas que não se encaixam nos estereótipos esperados, como submissão ou conformidade, e que desafiam normas sociais e raciais.

4º Passo: Análise das Alternativas

  • A) “responsabilização de jogadores negros pela derrota na final da Copa de 1950.”
    Incorreta. Embora o texto mencione a culpa atribuída a Barbosa e Bigode, o enfraquecimento do mito está ligado à postura ativa e contestadora de Paulo César Lima, não à submissão dos jogadores de 1950.
  • B) “projeção mundial da nação por um esporte antes destinado aos pobres.”
    Incorreta. O texto destaca a contradição entre o racismo e a função simbólica do futebol, mas isso não é o foco do enfraquecimento do mito.
  • C) “depreciação de um esporte associado à marginalidade.”
    Incorreta. Apesar de ser mencionado no início, o texto se concentra na denúncia de Paulo César Lima, não na depreciação do esporte.
  • D) “interdição da palavra ‘racismo’ no contexto esportivo.”
    Incorreta. Embora Paulo César denuncie o tabu da palavra “racismo”, o enfraquecimento do mito está mais ligado à sua postura contestadora.
  • E) “atitude contestadora de um ‘jogador-problema’.”
    Correta. Paulo César Lima, ao criticar o racismo no futebol e romper com o silêncio imposto, desafiou diretamente o mito da democracia racial.

Dica Geral:
⚠️ Concentre-se na relação entre o mito da democracia racial e o papel ativo de Paulo César Lima ao denunciar práticas racistas.


5º Passo: Conclusão e Justificativa Final

Conclusão:
A alternativa correta é a letra E, pois o texto destaca a atitude contestadora de Paulo César Lima como um elemento fundamental para expor e enfraquecer o mito da democracia racial no futebol brasileiro.

Resumo Final:
O texto atribui o enfraquecimento do mito da democracia racial à postura ativa e crítica de Paulo César Lima, que desafiou o racismo estrutural e simbólico no futebol, ao contrário da submissão imposta a outros jogadores negros em décadas anteriores.