Questão 46 caderno azul do ENEM 2020 PPL – Dia 1

Tu é um termo que não figura muito bem nos desenvolvimentos modernos e contemporâneos da ética e da política. Com efeito, muitos movimentos revolucionários (que variam do comunismo tradicional ao feminismo da irmandade) parecem compartilhar de um código linguístico curioso baseado na moral intrínseca dos pronomes. O nós é sempre positivo, o vós é um aliado possível, o eles tem o rosto de um antagonista, o eu é impróprio, e o tu é, obviamente, supérfluo.

CAVARERO, A. Relating Narratives apud BUTLER, J. Relatar a si mesmo. Belo Horizonte: Autêntica, 2015 (adaptado).

Um dos principais problemas morais da contemporaneidade, conforme mencionado no texto, reside na dificuldade em

A)  construir o diálogo coletivo.

B)  demarcar a presença do ego.

C)  viabilizar a afetividade pessoal.

D)  reconhecer a alteridade singular.

E)  ultrapassar a experiência intersubjetiva.

Resolução em texto

🔷 📘 Matérias Necessárias para a Solução da Questão:

Interpretação de texto, Filosofia (ética contemporânea), Pronomes e construção discursiva.

🔷 📔 Nível da Questão:

Médio

✅ Gabarito:

D) reconhecer a alteridade singular

🔷 🎯 Tema/Objetivo Geral:

Analisar como a linguagem e os pronomes revelam dificuldades morais e políticas na valorização da individualidade e da relação com o outro.


🔷 Passo 1: Análise do Comando e Definição do Objetivo

📌 Comando da questão:
“Um dos principais problemas morais da contemporaneidade, conforme mencionado no texto, reside na dificuldade em…”

📌 Explicação Detalhada:
A questão pede que você identifique qual problema moral atual é apontado no texto, considerando os efeitos simbólicos e sociais do uso dos pronomes pessoais e o que eles representam dentro de discursos políticos e éticos.

📌 Palavras-chave:

  • Problemas morais
  • Ética contemporânea
  • Dificuldade em reconhecer algo
  • Pronomes como representação simbólica

📌 Objetivo:
Determinar qual elemento é negligenciado ou considerado supérfluo nas construções éticas/políticas segundo a lógica apresentada no texto.

⚠️ Dica Geral:
Quando o enunciado envolve questões filosóficas e morais ligadas à linguagem, preste atenção na função simbólica das palavras e na forma como o autor critica a exclusão ou invisibilização de certos sujeitos no discurso político.


🔷 Passo 2: Explicação de Conceitos e Conteúdos Necessários

📌 Conceito de alteridade:
✔ Alteridade é a capacidade de reconhecer o outro como diferente de si mesmo, valorizando sua singularidade e subjetividade.
✔ Está ligada à ideia de diálogo ético, empatia e respeito à individualidade.

📌 Função simbólica dos pronomes:
✔ Os pronomes são aqui usados como metáforas políticas.

  • Nós = coletivo, união
  • Eles = o adversário
  • Eu = ego, individualismo
  • Tu = o outro direto, a alteridade
    ✔ O texto sugere que o “tu” é esquecido ou supérfluo, ou seja, o outro próximo é ignorado nas narrativas éticas modernas.

📌 Crítica à linguagem política contemporânea:
✔ A crítica está em como os discursos privilegiam o coletivo (nós) ou o inimigo (eles), sem espaço real para o tu, o outro que está perto, com quem devemos dialogar eticamente.


🔷 Passo 3: Tradução e Interpretação do Texto

📌 Trecho-chave:

“O nós é sempre positivo, o vós é um aliado possível, o eles tem o rosto de um antagonista, o eu é impróprio, e o tu é, obviamente, supérfluo.”

🔹 O texto constrói um mapa moral baseado em pronomes, mostrando como a linguagem revela a forma como nos posicionamos politicamente e eticamente.

📌 Frase-chave:

“O tu é, obviamente, supérfluo.”
🔹 Aqui, o autor critica a invisibilidade do outro singular — aquele com quem nos relacionamos diretamente.

📌 Relação com o conteúdo linguístico e ético:
✔ A linguagem política atual não tem espaço para o “tu” — ou seja, não há reconhecimento da alteridade como parte do discurso ético.


🔷 Passo 4: Desenvolvimento do Raciocínio

📌 A lógica do texto indica que os discursos políticos e éticos atuais valorizam identidades coletivas (nós) e antagonistas (eles), mas negligenciam o “tu”, ou seja, o outro próximo, o interlocutor direto, o diferente com quem se pode dialogar.

📌 O uso da palavra “supérfluo” para o “tu” denuncia a ausência de espaço para a relação interpessoal ética, para o reconhecimento do outro como sujeito único.

📌 Assim, o texto aponta como problema moral a dificuldade de estabelecer relações éticas baseadas no reconhecimento da individualidade do outro, ou seja, da alteridade singular.

⚠️ Dica Geral:
Sempre que houver um jogo com pronomes em textos filosóficos ou reflexivos, procure o que está sendo representado por cada pronome: eu (sujeito), tu (outro), nós (coletivo), eles (oposição).


🔷 Passo 5: Análise das Alternativas (ou Argumentos) e Resolução

📌 A) construir o diálogo coletivo.
❌ Incorreta. O “nós” é valorizado, o problema não é o diálogo coletivo, mas o esquecimento do outro individual.

📌 B) demarcar a presença do ego.
❌ Incorreta. O eu é considerado impróprio, mas o foco da crítica não é a questão do ego, e sim da exclusão do tu.

📌 C) viabilizar a afetividade pessoal.
❌ Incorreta. A afetividade é uma consequência possível, mas o foco aqui é ético, não emocional.

📌 D) reconhecer a alteridade singular.
✅ Correta. O texto denuncia que o tu é visto como supérfluo, ou seja, não há reconhecimento ético do outro como sujeito único, o que configura uma crise de alteridade.

📌 E) ultrapassar a experiência intersubjetiva.
❌ Incorreta. A crítica do texto é justamente a falta da intersubjetividade com o “tu” — não há o que ultrapassar, mas sim o que recuperar.


🔷 Passo 6: Conclusão e Justificativa Final

📌 Resumo do Raciocínio:
O texto critica a forma como os discursos éticos e políticos atuais excluem o tu — ou seja, o outro individual, com quem deveríamos nos relacionar diretamente. Isso revela um problema moral: a dificuldade de reconhecer a alteridade singular como central para o convívio ético.

📌 Reafirmação da Alternativa Correta:
Alternativa correta: D) reconhecer a alteridade singular

🔍 Resumo Final:
A ausência do “tu” no discurso político e ético contemporâneo denuncia uma crise de reconhecimento do outro enquanto sujeito único. O texto de Cavarero aponta para um problema de fundo: a perda do espaço do outro na ética. Assim, o principal problema moral é a falta de reconhecimento da alteridade singular, representada linguisticamente pela exclusão do pronome tu.

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