Eu gosto muito de todas as festas de Diamantina; mas quando são na igreja do Rosário, que é quase pegada à chácara de vovó, eu gosto ainda mais. Até parece que a festa é nossa. E este ano foi mesmo. Foi sorteada para rainha do Rosário uma ex–escrava de vovó chamada Júlia e para rei um negro muito entusiasmado que eu não conhecia. Coitada de Júlia! Ela vinha há muito tempo ajuntando dinheiro para comprar um rancho. Gastou tudo na festa e ainda ficou devendo. Agora é que eu vi como fica caro para os pobres dos negros serem reis por um dia. Júlia com o vestido e a coroa já gastou muito. Além disso, teve de dar um jantar para a corte toda. A rainha tem uma caudatária que vai atrás segurando na capa que tem uma grande cauda. Esta também é negra da chácara e ajudou no jantar. Eu acho graça é no entusiasmo dos pretos neste reinado tão curto. Ninguém rejeita o cargo, mesmo sabendo a despesa que dá!
MORLEY, Helena. Minha vida de menina. São Paulo: Companhia das Letras, 1998, p. 57.
O trecho acima apresenta marcas textuais que justificam o emprego da linguagem coloquial. O tom informal do discurso se deve ao fato de que se trata de
A) narrativa regionalista, que procura reproduzir as características mais típicas da região, como as falas
dos personagens e o contexto social a que pertencem.
B) carta pessoal, escrita pela autora e endereçada a um destinatário específico, com o qual ela tem intimidade suficiente para suprimir as formalidades da correspondência oficial.
C) registro no diário da autora, conforme indicam a data, o emprego da primeira pessoa, a expressão de reflexões pessoais e a ausência de uma intenção literária explícita na escrita.
D) narrativa de memórias, na qual a grande distância temporal entre o momento da escrita e o fato narrado
impõe o tom informal, pois a autora tem dificuldade de se lembrar com exatidão dos acontecimentos narrados.
E) narrativa oral, em que a autora deve escrever como se estivesse falando para um interlocutor, isto é, sem se preocupar com a norma-padrão da língua portuguesa e com referências exatas aos acontecimentos
mencionados.

Interpretação de texto, tipos de narrativas, registro pessoal, linguagem coloquial, escrita íntima e informal.
🎯 Nível da Questão: Médio.
✅ Gabarito: Letra C.
📖 Resolução Passo a Passo
🔍 Passo 1: Análise do Comando e Objetivo
O comando da questão solicita que identifiquemos o tom informal e a linguagem coloquial do trecho de Helena Morley. Isso nos leva a um ponto crucial: a forma de expressão da autora. O objetivo da questão não é apenas identificar o tipo de linguagem, mas também associá-la ao registro de escrita utilizado pela autora. Aqui, o importante é perceber como a linguagem coloquial e a primeira pessoa se entrelaçam, revelando um relato íntimo e pessoal. Esse texto não busca formar um enredo literário clássico, mas registrar uma experiência pessoal de maneira descomplicada.
📚 Passo 2: Explicação de Conceitos e Conteúdos Necessários
- Linguagem coloquial: Caracteriza-se por um tom mais informal, típico de conversas do dia a dia. No contexto literário, a linguagem coloquial se afasta da norma culta da língua e se aproxima da oralidade, com expressões mais espontâneas e naturais.
- Primeira pessoa: O uso da primeira pessoa no texto é uma indicação clara de subjetividade. A autora não narra uma história distante ou objetiva, mas sim suas experiências pessoais, seus pensamentos e suas impressões.
- Registro pessoal: No contexto da literatura, um registro pessoal é um tipo de escrita em que o autor expressa suas experiências ou reflexões de forma íntima, sem uma preocupação formal com a construção literária ou com as exigências de um gênero narrativo tradicional. O diário é um exemplo clássico desse tipo de escrita.
🧐 Passo 3: Tradução e Interpretação do Texto
O trecho de Helena Morley é um registro pessoal, escrito no formato de diário, onde ela compartilha suas experiências e reflexões. A autora utiliza a primeira pessoa (“Eu gosto muito de todas as festas de Diamantina”), o que mostra um tom subjetivo e íntimo. A data mencionada (30 de maio de 1893) e a ausência de uma estrutura literária formal indicam que o texto não é uma narrativa literária tradicional, mas sim uma descrição descomplicada e espontânea de suas vivências.
A autora não tem a intenção de criar um enredo literário, mas sim de expressar suas experiências de forma simples e pessoal. O uso de uma linguagem coloquial, próxima da fala cotidiana, e a reflexão sobre a festa em Diamantina reforçam o caráter de um registro íntimo e direto, como se ela estivesse conversando com o leitor, sem se preocupar com normas literárias formais. Isso evidencia que o texto é um diário pessoal, e não um relato literário ou uma narrativa oral.
✅ Passo 4: Análise das Alternativas e Resolução
A) Uma narrativa regionalista, que procura reproduzir as características mais típicas da região, como as falas dos personagens e o contexto social a que pertencem.
❌ ERRADA. Embora o texto tenha referências regionais, o foco não está em um estudo detalhado da região ou seus tipos sociais, mas sim no relato pessoal da autora.
B) Uma carta pessoal, escrita pela autora e endereçada a um destinatário específico, com o qual ela tem intimidade suficiente para suprimir as formalidades da correspondência oficial.
❌ ERRADA. O texto não se configura como uma carta, mas sim como um registro pessoal, sem destinatário.
C) Um registro no diário da autora, conforme indicam a data, o emprego da primeira pessoa, a expressão de reflexões pessoais e a ausência de uma intenção literária explícita na escrita.
✅ CORRETA. A autora usa a primeira pessoa e registra suas impressões de maneira espontânea, sem a formalidade de uma obra literária. A data e a natureza subjetiva da escrita confirmam que é um diário.
D) Uma narrativa de memórias, na qual a grande distância temporal entre o momento da escrita e o fato narrado impõe o tom informal, pois a autora tem dificuldade de se lembrar com exatidão dos acontecimentos narrados.
❌ ERRADA. A distância temporal não é mencionada como uma dificuldade para a autora, que parece lembrar-se bem dos fatos. O tom informal está mais relacionado ao registro pessoal.
E) Uma narrativa oral, em que a autora deve escrever como se estivesse falando para um interlocutor, isto é, sem se preocupar com a norma padrão da língua portuguesa e com referências exatas aos acontecimentos mencionados.
❌ ERRADA. Embora o texto tenha um tom coloquial, não se trata de uma narrativa oral. O conteúdo não se preocupa com a exatidão das referências, mas a forma de escrever é mais íntima, característica de um diário.
🏆 Passo 5: Conclusão e Justificativa Final
O texto é um registro de diário. A autora escreve de forma natural e espontânea, sem a intenção de seguir uma estrutura literária formal. Ela se utiliza da primeira pessoa e expressa suas reflexões pessoais, o que nos leva à alternativa C.